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sábado, 26 de novembro de 2011

Querida - Dalton Trevisan

- Olha, ali um restaurante. Quanto carro. Sinal que é boa a comida.

- Mais uma horinha na estrada e chegamos em casa.

- Você com essa eterna mania de não parar.

- Ta bem.

- Ih, tanta gente. Apresse o garçom. Tô morrendo de fome.

- Ei, Garçon. Nós queremos isso e aquilo. Bem rapidinho, por favor.

- Veja lá, aquele casal entrou depois de nós. E logo foi atendido.

- Paciência, meu bem. Mais um pouquinho.

- De novo. Ali, esse pessoal chegou mais tarde. E já tão servidos. Você não saber nem cobrar do garçom.

- Ah, é? Quer pressa? Olha aqui, seu garçom de merda. Traz já a comida ou...

- Ih, que vergonha. Você é um grosso. Não tem educação. Só dá espetáculo.

- Amor, fiz isso por você. Se não me...

- Sempre sou humilhada em público. Foi a última vez.

- Mas querida...

- Nunca mais entro num restaurante com você. Nunca mais, ouviu bem?

- ...

- E não sou tua querida!

Craquinho - Dalton Trevisan

Eu tava três dias fumando horrores. Sem comer. Sem dormir. Só queimando a pedra. Você para, a fissura te pega. Já se perde numa nóia de veneno.

Não é como outra droga, não. O craque. Cê não consegue largar. Quer mais um. Mais um. E mais um.

É diferente porque ele você ama.

Só dez segundinhos. Fatal. Te bate forte no peito. O bruto soco na cabeça. E o mágico tuimmm!

Na pedra, sabe? Tem um espírito vivo. Daí o craquinho fala direto comigo:

– Vai, Edu. Vai nessa, mermão!

Cê fica o tal. Olho de vidro, o polegar chamuscado, acelero alto. Mais força e poder. O pico de zoar no paraíso.

E já no inferno. Isso aí, bacana. O teu inferno sem volta.

Fatal.

O Amante - Dalton Trevisan

- Estava no boteco da esquina. Um tipo faceiro me perguntou: Você é o José? “Sou”. Tua mulher é a Joana? “Por que pergunta?” Sou amante dela.

- Barbina.

- Na hora pensei em acabar com o vagabundo. Guarda municipal, ando armado. Sorte que ele trazia uma criança pela mão. Desisti. Essa mulher na mesma hora saiu da minha vida. Nem sei se ainda existe.

- Nunca mais viu?

- Vi, sim. Uma vez. Fui descer do ônibus. Ela se bateu em mim. Me cuidou no olho, muito assustada. E sumiu no meio do povo. Parei e espiei pra trás – lá se foi, rebolando. Linda no vestidinho vermelho curto.

- ...

- Que desgracida, hein!

Ezequiel - Dalton Trevisan

Em Curitiba no ano de 1948 ou 49, não me lembro bem, João eu não sei se foi no ano de 1948 ou 49 que um homem veio lá em casa com desculpa de namorar minha tia. Ele se chamava Ezequiel, não sei qual é o sobrenome nem me interessa saber. Minha tia não o queria, era um homem feio, além disso sem profissão. Fiquei gostando dele porque levava um rádio e deixava-o lá em casa.
Certo dia, ele apareceu com um auto. Disse a meus pais que queria passear com meu irmãozinho. Meus pais deixaram. Eu fui na frente com ele, meu irmão atrás. Ele nos levou a uma rua deserta e parou a lata velha, é como dizem para certo tipo de carro. Ele pediu a meu irmão que se deitasse porque outro homem ia passar por ali. O outro homem não gostava de criança. Daí perguntou qual era meu nome, Joana eu disse, quantos aninhos você tem, oito anos eu disse, você quer uma boneca de cachinho, quero eu disse. Ele prometeu todas as bonecas de cachinho se eu não gritasse.
E isso repetiu-se algumas vezes. Uma tarde ele pediu a minha mãe para dar um passeio e ela deixou. Foi tudo mentira, me levou na casa onde morava. Me deixava na cama, dizia eu era a filhinha dele, chamada Rita igual minha tia. Como é teu nome, ele perguntava, Rita eu dizia. Na casa dele ia sempre de dia.
Eu lembro que nunca me beijou na boca. Certa vez foi no quarto. Não foi na cama e sim no guarda-roupa. Me arrumou em pé com a porta aberta, de maneira que fiquei da altura dele.
Mudamos para Antonina. Ele foi lá um ano depois. Numa tarde em que meu pai andava na rua. Estava só a mãe, meu irmão e eu. Conversou um pouco, minha mãe foi fazer café. Eu, meu irmão e ele ficamos na sala. Me pôs no colo, abriu um jornal, mandou que eu lesse. Bem o meu irmão ficou desconfiado dos movimentos que ele fez.
Papais foi embora para o mar. Minha tia casou com outro. O tal nunca mais foi lá em casa, não sei se morreu. O nome dele é Ezequiel.

Duzentos Ladrões

Há meio ano recebi de algumas pessoas queridas uma versão pocket de Danton Trevisan, chamada Duzentos Ladrões, em meio a uma porção de livros emprestados. Não lembro quais foram as recomendações, as indicações e a opinião de ambos, além do comentário que poderia ser uma leitura rápida. O semestre letivo passou e hoje eu o peguei da estante. Junto dele trouxe para o quarto A Sociedade do Anel e A Brincadeira que estão fazendo companhia para uma coleção de livros “para ser lidos com tempo”.

Comecei a leitura sem nenhuma leitura prévia sobre o autor, a forma como escreve, o gênero literário ou o tempo da escrita. Foi surpreendente. Diferente do que estou acostumada. Tratam-se de pequenos...não sei se pode se dar essa classificação...Mas vamos dizer que sim, então, são pequenos contos que chamaram minha atenção e lembraram o absurdo do existencialismo de Camus. Além disso, há uma pontuação, um uso ou falta de vírgulas, não sei, que me confundiu um pouco, algumas vezes tive que reler pra ver se encontrava outro significado e, muitas dessas vezes, não o encontrei. Talvez por estar com O Senhor dos Anéis e A Brincadeira ao meu lado, deitados sobre a mesma cama, não via a hora de terminar aquela leitura que me mexia comigo de forma estranha. Lembrei de Barthes ao citar a diferença entre textos de prazer e de gozo. Certamente não estava sendo um texto de prazer, seria de gozo?

Para cada um dos textos eu tinha algumas observações, geralmente negativas - se o autor pudesse me ouvir, mas nenhuma comparada à repulsão que me invadiu ao ler Ezequiel. Há pouco tempo a Secretaria de Saúde de Chapecó criou o Comitê Contra Violência Infantil, eu escuto os comentários sobre as formas de violência sexual, como ocorrem, por quem são provocadas, e sempre tenho mais certeza de que eu não suportaria fazer parte deste comitê e precisar ouvir maiores detalhes. Ezequiel poderia bem ser um relato de uma das meninas. Comentários que eu não gostaria de ouvir de nenhuma criança. Parei de ler, respirei um pouco e pulei algumas páginas.

Fui para O Amante e pensei: “Quem falaria uma coisa dessas?” No fim de tudo, depois de voltar e ler outros textos da metade do livro descobri que, definitivamente era mesmo uma leitura rápida, mas que Craquinho não poderia nem mesmo ser usada nas aulas do Proerd e que Querida mostra como tantas vezes nós mulheres somos idiotas com os homens e como os homens tentam surpreender-nos sem pensar nas conseqüências, mas que agora estou voltando a viver. Hoje eu li o primeiro livro sem ter que fazer análise ou qualquer coisa do gênero. Hoje eu li o primeiro livro, acho que no ano, sem que precisasse ler. É, voltei a viver hoje, certamente. Agora vou ver o que Kundera e Tolkien têm pra me dizer.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Acidentes de trânsito: podemos evitá-los?



Não gosto de falar em tragédia, mas algumas coisas que acontecem me chocam um pouco.
Hoje quando meu namorado chegou em casa às 11h20 comentou que a rua próximo à padaria Dona Ana estava interditada e, por isso, teve que contornar. Ele comentou que não estava sabendo de nenhuma simulação, então devia ser um acidente com morte.
Quando ouvi isso não dei muita atenção, pensei ser um acidente qualquer e nem considerei que, por ele ser policial, sabe as diferenças de procedimentos em cada caso.
Quando cheguei ao serviço um de meus colegas perguntou se eu vi a morte do motociclista próximo de casa. E eu disse que tinha ouvido alguma coisa. Meus colegas sempre estão me alertando sobre o perigo de andar de moto e essa pergunta foi meio que um "tá vendo? tome cuidado!" Logo chegou outra colega e comentou que deu um acidente de trabalho com um policial, com morte. Nessa hora eu já sabia que era um policial motociclista que havia morrido. Então chegou meu outro colega e perguntou, com toda cautela, se o Everton trabalha com moto. Eu respondi que sim, mas que não era ele quem se envolveu no acidente perto de casa.
Pareceu até engraçado, mas as coincidências me chocaram. Policial, com moto, próximo da minha casa...nossa! Podia mesmo ter sido o Everton! Podia ter sido eu também, mas então eu não me importaria muito.
Ainda não entendi exatamente o que aconteceu, minha hipótese foi derrubada quando vi as fotos, mas o certo é que natural não foi. Certamente há pessoas chorando hoje em consequência do erro de alguém, de quem, pouco importa. O importante é que as pessoas não têm consciência de que veículo automotivo é uma arma fatal nas nossas mãos se não soubermos usar.
Eu sou motorista de carro e moto, sou ciclista (inclusive hoje mesmo fui trabalhar de bike, por isso não passei pelo acidente, uso um percurso menos movimentado) e pedestre. Percebo diariamente a falta de responsabilidade dos usuários de trânsito. Nem só de um, nem só de outro. A irresponsabilidade é de todo mundo. Como dizia meu professor de auto-escola, "motociclista (e eu acrescento pedestre) não têm preferencial. Acho que isso serve pra todos, inclusive carros, caminhões, ônibus. É a direção defensiva que tanto se fala. O segredo é evitar acidentes, sempre.
Não estou dizendo que eu sou perfeita no trânsito, que não cometo nenhuma infração, que nunca faço "barbeiragens", o que quero dizer é que todos somos responsáveis por tudo que nos envolve. Primeiro que não há porque andar rápido dentro da cidade. Se você sabe mesmo dirigir vai saber distinguir a velocidade necessária numa rodovia rural pavimentada de uma urbana. O que dificilmente se percebe nos comportamentos, infelizmente, mas eu tenho esperanças que um dia possamos nos convencer disso. Há pesquisas que mostram que aumentar a velocidade não faz tanta diferença assim no tempo gasto, especialmente dentro da cidade. Faz diferença é no bolso e em algumas vidas.
Não faz muito eu estava na faixa da direita, em torno de 40 km/h, quando um motociclista nervosinho (cara-de-pau!) teve a capacidade de me ultrapassar pela direita (sim, eu estava na faixa da direita e ele me ultrapassou pela minha direita!) reclamando por eu estar devagar. Eu até olhei o velocímetro pra ter certeza e quase não acreditei. Ele não me ultrapassou pela esquerda porque tinha outro carro naquela pista. Não bastasse isso, o idiota foi alcançado por mim logo em seguida, pois teve que parar num sinal.
São essas atitudes que resultam em acidentes graves, mas evitáveis. E a responsabilidade é nossa, de todos.
Deixemos os acidentes serem somente acidentes mesmo, daqueles que não poderiam ter sido evitados e que serão poucos.




As informações sobre o acidente que comentei podem ser lidas em http://www.clauderioaugusto.com.br/, mas que também segue abaixo:

Hoje por volta de 11 horas da manhã aconteceu um acidente com vítima fatal na rótula das ruas Sete de Setembro com Índio Condá no bairro Presidente Médice. Foram envolvidos moto da PMSC e caminhão de ração. Após a colisão o rodado do caminhão passou sobre a cabeça do policial militar Marcos Alexandre de Almeida Bueno, 27 anos, da última escola, formado há 30 dias, que há 20 escolheu atuar no Pelotão de Motos, morreu no local. O Corpo de Bombeiros de Chapecó esteve no local, mas como a vítima já estava em óbito, foi feito isolamento do local pela PM para que o IGP da Secretaria de Segurança Pública fizesse o levantamento. Após, o corpo foi encaminhado ao IML para depois ser liberado para familiares, para funerais e sepultamento. O policial, soldado Almeida, com outros dois colegas, todos com motos, faziam serviço de patrulhamento no bairro quando ocorreu o acidente. Segundo alguns populares, que viram o acidente, o PM ao se aproximar da rótula, freou, perdeu o equilíbrio e caiu. O caminhão passou com o rodado por cima de sua cabeça. O condutor do caminhão, Alcides João Molozzi, 65 anos, foi conduzido para a Delegacia de Policia. Após prestar depoimento ele foi liberado.
Peritos do Instituto Geral de Perícia (IGP) fizeram o levantamento do acidente.

O corpo do soldado foi transladado para Francisco Beltrão no Paraná. O enterro está marcado para sábado de manhã.


Algumas coisas merecem ser postadas e guardadas para sempre, como esse curta-metragem do José Agripino sobre Poliamor.

A sinopse: "Numa sociedade onde predominam valores afetivos monogâmicos, algumas pessoas optam por um arranjo de relacionamento que está se tornando conhecido com Poliamor."

A falta de conhecimento das pessoas sobre o que é Poliamor é algo que me incomoda bastante, quando se fala na palavra, quem ouve tende a pensar e comentar algo que insinua qualquer coisa, menos Poliamor. Sempre sai um comentário bobinho como "hummm..tá tudo liberado então!" ou, ainda pior, se é homem já acha que pode tudo com a mulher que comentou ser poliamorista.
Mas eu pergunto: "Peraí! Eu me considerar livre para ter outros relacionamentos não significa que eu vou fazer isso a todo momento! Eu já fui solteira (durante 19 anos) e nunca tive vários relacionamentos por isso, porquê teria agora?

Engraçado como eu estou achando qualquer coisa que eu fale idiota depois de assistir esse curta.

Repórter perguntou pra uma das entrevistadas: "Como dá tempo de dar atenção a todas elas?"
E ela: "Como vc conseguiu dar atenção ao teu pai e tua mãe durante toda tua vida?"


Obrigada pela dica, Rodrigo.